Qualidade dos Médiuns
Allan Kardec
- A faculdade mediúnica é uma propriedade orgânica; não depende das qualidades morais do médium; mostras-nos em diversos graus da escala moral. O mesmo não se dá, entretanto, com a preferência que os bons Espíritos dão aos médiuns.
- Os bons Espíritos comunicam-se mais ou menos espontaneamente, por este ou aquele médium, conforme a simpatia que lhes inspiram. A boa ou má qualidade dos médiuns não deve ser aquilatada pela maior ou menor facilidade com que recebe as comunicações, mas por sua aptidão em receber apenas bons Espíritos e não ser joguete de Espíritos zombeteiros.
- Por vezes os médiuns de menor padrão de moralidade recebem excelentes comunicações que não poderiam vir senão de Espíritos bons. Isto, porém, não deve causar espanto; elas sempre vêm com o objetivo de lhes dar sábios conselhos.
Se os médiuns os desprezam, maior será a sua culpa, porque lavram a sua própria condenação. Deus, na sua infinita bondade, não pode recusar assistência àqueles que dela mais necessitam. O virtuoso missionário que vai pregar aos criminosos procede como os bons Espíritos com os médiuns imperfeitos.
Por outro lado, querendo dar a todos um ensino útil, servem-se os bons Espíritos do instrumento de que dispõem; mas o deixam assim que encontram outro mais simpático e que melhor aproveite as suas lições.
Com a retirada dos bons, os Espíritos inferiores, que pouco se incomodam com as qualidades morais dos médiuns, encontram o campo livre.
Em conseqüência, os médiuns moralmente imperfeitos, os que não procuram emendar-se, mais cedo ou mais tarde são presas dos maus Espíritos, que por vezes os conduzem à ruína e às maiores desgraças, ainda na vida terrena. Então a sua mediunidade, inicialmente tão bela, e que assim poderia ter sido conservada, se perverte e finalmente se perde, abandonada dos bons Espíritos.
- Não se acham os médiuns de maior merecimento a salvo das mistificações dos Espíritos embusteiros. Primeiro, porque entre nós ainda não há criaturas suficientemente perfeitas e que não apresentem um lado fraco, o qual dá acesso aos maus Espíritos; segundo, porque às vezes os bons Espíritos permitem que os maus se manifestem, a fim de que exercitemos a nossa razão e aprendamos a distinguir a verdade do erro e fiquemos de prevenção, não aceitando cegamente e sem maior exame tudo quanto nos vem dos Espíritos. Entretanto, jamais um bom Espírito nos virá enganar. O erro, seja qual for o nome com que se acoberte, vem sempre de uma fonte má. Podem, ainda, essas mistificações ser uma prova para a paciência e para a perseverança de um espírita, quer seja médium, quer não o seja. Os que desanimam com as decepções dão aos bons Espíritos uma prova de que não são instrumentos de confiança.
- Não é para admirar que os maus Espíritos possam obsidiar criaturas de valor, pois na Terra também se encontram homens de bem perseguidos pelos que não o são.
É digna de nota a diminuição do número de médiuns obsidiados após a publicação de O Livro dos Médiuns. Compreende-se que, estando prevenidos, conservem-se vigilantes e notem os mais leves indícios que denunciam a presença dos mistificadores.
A maioria dos que ainda se mostram em tal estado ou não fizeram o recomendado estudo prévio, ou não deram importância aos conselhos recebidos.
- Aquilo que realmente constitui o médium é a faculdade mediúnica. Sob tal ponto de vista, pode ser mais ou menos formado, mais ou menos desenvolvido.
Médium seguro, que pode, na verdade, ser considerado bom médium, é aquele que aplica a sua faculdade visando tornar-se apto a servir de intérprete aos bons Espíritos. O poder que tem o médium de atrair bons Espíritos e repelir os maus está na razão direta de sua superioridade moral e da posse de maior número de qualidades que constituem o homem de bem. É por elas que atraímos a simpatia dos bons Espíritos e adquirimos ascendente sobre os maus.
- Pelas mesmas razões, as imperfeições morais do médium o aproximam da natureza dos maus Espíritos, tiram-lhe a força necessária para os afastar de si e, ao invés de se lhes impor, sofre a imposição deles.
Isto não só se aplica aos médiuns, mas a todas as pessoas, indiscriminadamente, visto como não há ninguém que não esteja sujeito à influência dos Espíritos.
- Com o fito de se imporem ao médium, os maus Espíritos sabem explorar com habilidade todas as suas fraquezas. E dos nossos defeitos, é o orgulho aquele que mais os atrai, por ser o sentimento predominante na maior parte dos médiuns obsidiados e, notadamente, dos fascinados. É o orgulho que os leva a se considerarem infalíveis e a repelir todos os conselhos. Infelizmente, tal sentimento é excitado pelos elogios que lhes são feitos. Basta que um médium apresente uma faculdade levemente transcendente para que o procurem e o adulem. Isso dá lugar a que exagere a sua importância e se considere indispensável – o que constitui a sua perda.
- Ao contrário do médium imperfeito, que se orgulha dos nomes ilustres – mas quase sempre apócrifos – que subscrevem as comunicações por ele recebidas, e se julga um intérprete das forças celestes, o bom médium jamais se crê bastante digno de tal favor: tem sempre uma saudável desconfiança do mérito daquilo que recebe e não confia em seu próprio julgamento. Como é apenas um instrumento passivo, compreende que as boas mensagens nenhum mérito pessoal lhe confere, do mesmo modo que nenhuma responsabilidade teria se fossem más; e mais: que seria ridículo acreditar na identidade absoluta e insofismável dos Espíritos que se manifestam por seu intermédio.
O bom médium deixa que pessoas desinteressadas julguem o seu trabalho, sem que o seu amor-próprio se sinta ferido por qualquer opinião desfavorável, da mesma maneira que um ator não se sentirá melindrado pelas críticas feitas à peça que representa.
Seu caráter marcante é a simplicidade e a modéstia. Sente-se feliz com a faculdade que possui, não por vaidade, mas porque lhe é um meio de tornar-se útil – o que faz de boa-vontade, sempre que se lhe oferece uma oportunidade – e jamais se incomoda quando outros médiuns são preferidos.
São os médiuns os intermediários, os intérpretes dos Espíritos. Ao evocador, como ao simples observador, cabe apreciar o valor do instrumento.
- Do mesmo modo que as outras faculdades, é a mediunidade um dom de Deus, que tanto pode ser empregado para o bem quanto para o mal e do qual, pois, pode-se abusar. Seu fim é nos pôr em comunicação direta com as almas dos que viveram, a fim de recebermos ensinamentos e nos adaptarmos às necessidades da vida futura. Do mesmo modo que a vista nos põe em relação com seu mundo visível, a mediunidade nos põe com o mundo invisível.
Aquele que utiliza a mediunidade para o adiantamento próprio e o de seus irmãos desempenha uma verdadeira missão, pelo que será premiado. Aquele que abusa, empregando-a em coisas fúteis ou para satisfação de interesses materiais, a desvia de seu objetivo providencial e, mais cedo ou mais tarde, será punido, como todos aqueles que fazem mau uso de qualquer faculdade.
Livro: “O Principiante Espírita” – Por Allan Kardec – Parte 01- itens 79 à 88
(Introdução ao conhecimento do mundo invisível pelas manifestações espíritas; Resumo da Doutrina Espírita; Respostas às principais objeções).